Um dia um contador de histórias passou pela nossa cidade e logo foi rodeado por todos os moradores, sedentos de contos e novelas lendárias, notícias de fora ou apenas uma palavra amiga. Vinha cansado, andara todo o dia e tinha seca a sua garganta. Perguntou se podia primeiro ir beber algo à taberna. Para lá nos dirigimos todos, ansiosos por ouvi-lo falar. O taberneiro ofereceu-lhe logo uma caneca da mais fresca cerveja que se podia obter naqueles dias do Estio castigador. Mas ele recusou. 'Tem chá?'. Um pouco atónito o taberneiro disse que a sua falecida mulher juntara na cave umas ervas variadas das quais fazia chá para as outras mulheres da vila, mas ele não sabia fazê-lo como ela sabia. 'Não faz mal que eu mesmo o preparo enquanto conto histórias'. Lá vieram as ervas secas e um pote de água fervida e enquanto falava o contador de histórias esfregou nos dedos as folhas e caules encanecidos polvilhando a água quente com o seu aroma. De seguida mexeu suavemente a mesma até ficar turva e, depois, novamente cristalina, mas esverdeada. 'Venho de uma terra distante de bravos guerreiros e heróis. Presenciei uma batalha tremenda ainda a semana passada que esses soldados venceram bravamente. 5-2 depois de estarem a perder. Via-se que a aparente desorganização inicial se devia à ausência dos mais experientes homens que tinha ficado retidos em outras aventuras que contarei noutro dia. O inimigo não perdoou a inexperiência e, acirradamente, desferiu dois golpes. Mas quando a legião mais sabedora entrou na refrega, o rumo da contenda mudou prontamente. Eis as notícias que querias ouvir.'
Bebericou o chá e, acalentado, prosseguiu: 'Quanto a lendas, dizem as pessoas de tal terra que ficarão para a história esses mesmos soldados que souberam resgatar das mãos de outros a vitória pela qual seguem treinando todos os dias. Dizem que estão para nascer os poetas que os cantarão, dizem até que está para nascer o Sol que brilhe tanto quantos os Heróis da Ilíada!'
Os olhos rebrilhavam nos rostos de quem o ouvia, os corações bebiam do calor das suas palavras. Quando findada a bebida e reposta a sua garganta, levantou-se o contador e, dirigindo-se ao taberneiro, disse meigamente: 'Foi o melhor chá que bebi. Antes de adormecer, hoje quando o sol se puser, lembrar-me-ei da tua mulher e da sabedoria e amor com que preparava este líquido conforto.'
Sem dizer mais nada, abraçando apenas o taberneiro que não lhe exigiu moeda alguma, saiu o contador da taberna e acenando aos que ficavam virou-lhes as costas antes de levar de novo as pontas dos dedos com que quebrou as folhas de chá ao nariz, retendo o perfume da taberna, do chá, do mundo...